Divórcio Enquanto Crise Familiar

  • Por Joana Pereira
  • 24 abr., 2019

A Separação enquanto crise familiar

            Nos dias de hoje há cada vez mais separações e esse foi um dos motivos que me levou a escrever acerca deste assunto, mas não só. Pensei sobretudo no sofrimento que sinto e que é trazido, pela criança ou pelo adolescente e pelos pais, seja em situações quase imediatamente após a separação, mas também anos mais tarde.

            No trabalho em clínica privada, provavelmente, cerca de um quarto a um terço dos pedidos de ajuda que recebemos são potenciados por situações de separação ou resultam daí. Embora seja verdade que os filhos de pais divorciados/separados e/ou de famílias reconstituídas tendem a apresentar mais problemas emocionais e comportamentais, não podemos atribuir as “culpas” à separação per si. O ajustamento a esta nova realidade depende de vários factores e, neste sentido, parece-me relevante salientar a qualidade das relações; a qualidade da relação entre os pais antes da separação, a qualidade da relação entre os pais após a separação; e a qualidade da relação da criança ou adolescente com os pais.

            A separação (ou o divórcio) é e deve ser pensado/olhado como uma das principais e mais difíceis crises no ciclo vital de uma família. Como tal, requer um período de adaptação. Trata-se de um momento de sofrimento para todos e em que uma multiplicidade de factores potencialmente stressantes entram em acção, o que requer a procura de um novo equilibro, familiar, mas também individual e nem todos o encontram ao mesmo ritmo. É portanto, essencial respeitar tempos, compreender o seu impacto em cada um e se necessário procurar ajuda especializada o quanto antes, seja para os mais novos ou para os mais graúdos, e aqui incluo os adultos, que não devem, em momento algum, sentir-se envergonhados por fazê-lo.

            

Toda a crise implica mudança, mas nem todas as mudanças têm que ser negativas, embora possam ser assustadoras e potencialmente perigosas. A verdade é que uma crise acarreta alguma desorganização que, pela mudança que daí advém, leva à necessidade de procura de um novo reajuste/equilíbrio. Assim, o divórcio, enquanto crise, requer que haja um processo de adaptação e adopção de um novo conjunto de regras e papéis. Mas será assim tão simples? Não. Existem um sem número de questões que pesam e influenciam o bem-estar de todos os seus intervenientes. Sem as esgotarmos, podemos pensar, por exemplo, nas mudanças estruturais e emocionais levantadas pela saída de casa de um dos pais, o impacto de uma eventual mudança de casa, por vezes, de escola, a possível perda de nível socio-económico, mas também, o nível de conflito entre os pais, assim como as características individuais de cada um dos membros da família.

            Posto isto, e não querendo obviamente desvalorizar o sofrimento dos adultos, as crianças e adolescentes envolvidos num processo de separação não têm maturidade ou obrigação de compreender e lidar tranquilamente com a perda da estrutura da sua família, isso cabe, sim, aos pais. Cabe aos pais manterem uma atitude responsável e de co-parentalidade, por forma a transmitirem continuidade, consistência, protecção, segurança e diálogo, com o intuito de promoverem uma melhor adaptação e minimizar o sofrimento dos seus filhos.


            Os sentimentos de, culpa, tristeza, rejeição, abandono, medo, insegurança, confusão e zanga, entre tantos outros, são frequentes na criança e no adolescente. Contudo, existem “pequenas coisas” que os pais poderão fazer para diminuir seu impacto e duração. Além do seu bem-estar emocional enquanto mãe/pai e adultos, deve fazer-se os possíveis por: manter as rotinas, desde a escola (quando possível) aos hábitos de alimentação e sono; evitar situações de conflito ou discussões na sua presença ou com o seu conhecimento; verbalizar e demonstrar que eles não são os culpados e que, independentemente da separação, não serão abandonados e os pais continuam a amá-los; manter canais de diálogo abertos e esclarecer eventuais dúvidas ou preocupações; não culpabilizar nenhum dos pais; e estar disponível numa atitude de aceitação e compreensão.

            Porque somos pessoas e não desempenhamos apenas um papel na nossa vida, mas uma multiplicidade deles, cada um com os seus desafios, e a juntar a isto temos ainda a nossa “bagagem”, os nossos medos, preocupações, dúvidas, inseguranças, conflitos internos, por vezes, necessitamos de procurar ajuda especializada. É aqui que a Psicologia ou a Psicoterapia poderá ajudar, funcionando como auxiliares no suporte e promoção de um novo equilíbrio psicoafectivo.